12 de jun. de 2009

Sobre tudo menos samba


Longe de Shakespeare e perto do universo de onde não vim mas onde vivo, me impressiona a capacidade que as coisas têm de, como se fossem ímãs, cercarem-se do que não são conforme passam os anos e gira a roda.


O próprio Shakespeare, hoje, quando lido, recitado ou representado, ganha inexplicáveis ares de sofisticação, apesar de ser coloquial em forma, conceito e linguagem, à época, aquilo que escrevia.

Não é a toa que é dele a frase-conflito mais parafraseada da história da humanidade, repleta que é de simplicidade e complexidade. Pois bem, Mr. Shakespeare, faço minhas as suas, não sem uma pequena transbordação (Ubaldiana) casuísta:

To be or not to be... sambista, that is the question.

Já tive mais problemas com esse dilema - não o de fazer e viver do samba, mas o de autorreferir sambista - mas aos poucos percebi que ele é tão eterno quanto inútil.

Inútil porque falamos do samba que um dia lutara para simplesmente deixar de ser ilegal e que se tornou a maior representação cultural de um país da dimensão do nosso, mestiço como é o nosso. Esse mesmo samba hoje responde a uma casta (hare baba!) a determinar quem leva seu nome como ofício ou não. Casta essa que eu admiro muito e de cuja existência reconheço o caráter indispensável. Mas agradeço aos céus - ecumenicamente - por não pertencer a ela, muito menos ao grupo dos que merecem dela o que considero ser apenas um rótulo.

Não quero pertencer e não pertenço a esse grupo porque não sou puro o suficiente para ser de nenhum grupo. Um indivíduo é aceito num grupo não por escolher fazer parte dele, mas por escolher invariavelmente não fazer parte de nenhum outro grupo. Há indivíduos, como eu, que preferem aceitar grupos do que ser aceitos por eles.

Me conforta um pouco saber que, mesmo entre sambistas com esses maiúsculos, não há consenso sobre o próprio samba, que samba, ele próprio, entre exibir-se orgulhoso à duquesa de Kent no Itamaraty e agonizar frente às outras culturas que a fidalguia do salão lhe impõe. Claro está apenas, na minha cabeça, que o samba diz menos respeito à tradição do que à subversão, seja sendo conservador, seja sendo revolucionário.

Eu acho que o samba basta. Mas eu tenho arrepios quando vejo o samba dizer que se basta.

Por isso tudo eu não atrevo a dizer do que é feito, ainda que eu ouça delicada e atentamente, todos que se atreverem.

Afinal, é tudo uma grande invenção.

Nenhum comentário: